Cala Goloritzé

No topo da Aguglia

" ... uma incrível agulha de calcário que surge solitária, ao fundo de um exuberante vale de vegetação mediterrânica."

Muito antes de lermos sobre a mítica via de escalada com 475 metros em Gola su Gorropu, vimos uma imagem da Sardenha que jamais nos deixaria de acompanhar nos nossos sonhos. Essa imagem revela uma incrível agulha de calcário que surge solitária, ao fundo de um exuberante vale de vegetação mediterrânica. Rodeada por falésias incríveis, encontra-se envolvida numa enseada de seixos brancos e redondos, banhada por águas puramente cristalinas.

Estou a falar de Cala Goloritzé, a baía mais bonita e paradisíaca que alguma vez ousei sequer sonhar existir! Não é por acaso ela foi fotografada para ser a capa do guia “Lonely Planet Sardinia”. E depois de tanto desfolhar as páginas desse guia, seria impossível não me imaginar no topo da delicada agulha sob águas azul turquesa. Eu e o meu parceirinho de aventuras.

Para além de barco, a única forma de chegar a esta enseada é a pé! E é a pé que nos faz sentido chegar e descobrir um lugar novo. Sozinhos e imersos no nosso sonho.

Temos de admitir que não somos propriamente madrugadores. Bem, pelo menos eu não sou. E o certo é que lá arranjo sempre maneira de ficarmos mais uns momentos aninhados dentro da nossa tenda. A vontade de sair é grande mas há sempre algo no meu saco-cama que me agarra como se tivesse dentes bem afiados. E, mesmo sabendo que, pela milésima vez, acordar cedo é imprescindível em dias como este, eram nove horas, e ainda me espreguiçava lentamente.

Ao despertador, talvez até demasiado dócil, do Jorge, lá me levantei. Preparámos tudo o que faltava preparar, tomamos o pequeno almoço e saímos do Parque de Campismo de Cala Gonone.

A viagem de Cala Gonone até ao ponto de partida do trilho de Cala Goloritzé demora por volta de hora e meia. Uma viagem feita por paisagens épicas, todas elas parte do impressionante Parque Nacional do Golfo de Orosei e del Gernagentu.

Da estrada, lá ao longe, voltámos a ver a impressionante garganta de Gola su Gorropu, onde dois dias antes fizéramos mais uma peça da nossa história, tendo escalado a mais alta via de escalada das nossas vidas. Uma miragem quase, se não fosse pelas memórias frescas desse dia incrível. Deixámo-nos levar pela emoção à medida que olhávamos para as montanhas brancas do Supramonte, erguidas majestosamente por detrás do Valle di Lanaitto. Passámos o colo de Passo Ghenna Silana, o local onde deixáramos o carro para descer até à Gola su Gorropu e continuámos no nosso Renault Clio rumo a um mundo desconhecido até então.

A primeira localidade que encontrámos depois de tantas curvas e contra curvas foi Baunei, uma pequena vila no sopé da montanha, com uma vista desafogada para o mar. É também aqui que desviamos  para  norte, subindo o Supramonte de Baunei. Após uns oito quilómetros chegámos ao nosso ponto de partida, o Altipiano di Baunei, uma depressão cársica de grande dimensão, coberta por uma densa vegetação de carvalhos, zimbros e arbustos mediterrânicos. Uma paisagem selvagem e inóspita, mas ainda assim tão luxuriante e cheia de viva.

"... Deixámo-nos levar pela emoção à medida que olhávamos para as montanhas brancas do Supramonte, erguidas majestosamente por detrás do Valle di Lanaitto."

"...Uma simbiose que vale a pena lembrar. Uma de equilíbrio entre o que a natureza dá e o que o Homem procura."

Deixámos o carro no parque de estacionamento do bar “Su Porteddu“, pusemos as mochilas com o equipamento às costas e iniciámos o percurso de uma hora (3,52 km) até Cala Goloritzé. A primeira secção do trilho é feita a subir ligeiramente, até que chegamos ao ponto mais alto (505 metros), onde foi possível ver a pontinha da agulha que nos esperava imóvel lá em baixo.

A partir dali descemos continuamente por um trilho que percorre o desfiladeiro de Bacu Goloritzé até ao mar. À medida que descíamos foram surgindo paredes de calcário cada vez mais imponentes em ambos os lados do vale, tal como enormes carvalhos que nos ofereciam a sombra necessária para podermos suportar melhor aquele dia quente de verão.

Caminhámos entretidos pela beleza do vale e pelas diversas formações de rocha calcária. Uma riqueza natural que não podia deixar de se fazer acompanhar pela riqueza cultural deste lugar. Sim, porque o homem está também aqui presente. Testemunha desse património e história são os abrigos de pastores que surgem naquilo que parece uma paisagem implacável para o ser humano. Aproveitando a barreira natural oferecida pelas pequenas grutas e lapas, criam abrigos temporários com pedras, troncos e ramos de arbustos (ginepro). Uma simbiose que vale a pena lembrar. Uma de equilíbrio entre o que a natureza dá e o que o Homem procura.

Continuámos a ziguezaguear pelo pequeno trilho preenchido por seixos irregulares de calcário branco, até ficarmos envolvidos no meio de arbustos mediterrânicos (maquis), que quando nos deram tréguas, nos permitiram ter o primeiro vislumbre da tão aguardada agulha!

Já não era nada cedo, pelo que decidimos ir de imediato para a base da agulha, antes sequer de ver a bela praia! Tive que deixar a minha curiosidade esperar mais um pouco.

Comecei a sentir o coração a palpitar! A via de escalada que estávamos prestes a fazer chama-se “Easy Gymnopedie” e tem cerca de 140 metros, com um grau máximo de 6b/6c. A envolvência do local, tal como a própria agulha, fazem desta via de escalada uma das mais belas no Mediterrâneo.

Lembro perfeitamente daquele cocktail de emoções. Estava sozinha na base da via, prestes a iniciar o primeiro largo, enquanto o Jorge já me esperava na primeira reunião. Uma mistura de ansiedade, medo, excitação e pura alegria! Sabia que iria ser mais exigente, fisicamente e mentalmente, do que qualquer outra escalada que fizera antes. E, mesmo sabendo perfeitamente que estava acima das minhas capacidades ou muito perto do meu limite, ainda assim atrevi-me a dar aquele primeiro passo. Havia conseguido sair da segurança do chão.

O primeiro largo bastou para perceber que iria ser um grande desafio chegar ao cume da bela agulha. Apesar da pedra solta e das presas algo polidas, características deste primeiro largo, consegui chegar ao conforto da companhia do Jorge. Foi então que já mais relaxada olhei pela primeira vez em meu redor!

– “Dá para acreditar?” disse em sobressalto!

Era mais que belo, mais que perfeito! Os meus olhos cintilavam ao ver aquela costa azul turquesa a estender-se até ao horizonte! Que lugar tão belo e selvagem, onde a rocha clara se mistura tão harmoniosamente com o azul cristalino do mar e o verde intenso dos zimbros.

" Lembro perfeitamente daquele cocktail de emoções. Estava sozinha na base da via, prestes a iniciar o primeiro largo, enquanto o Jorge já me esperava na primeira reunião."

"... E eu ali pendurada nas suas costas deixei-me envolver por ela e pela sua história... quis fazer parte dela e ser ela... ser tão imortal quanto ela!"

Parecia estar a sonhar! Mas bastava a leve brisa quente tocar-me na pele para tornar o meu sonho bem real. Senti-me tão sortuda, feliz, amada e num êxtase tal que me enchia o coração! Era bom demais! O mundo é belo demais! Belo demais para não ver e experienciar!

Aquela imponente rocha permanece ali, solitária, há milhões de anos. Já viu passar a história a seu lado tantas vezes que já se tornou parte dela. E eu ali pendurada nas suas costas deixei-me envolver por ela e pela sua história… quis fazer parte dela e ser ela… ser tão imortal quanto ela!

Há algo mais belo na vida? Ambicionar estar onde poucos ou mesmo ninguém esteve?! Mergulhar na História de sítios perdidos no tempo?! Querer estar lá, poder tocar quando o simples olhar não basta?! Querer viver mais intensamente, ir mais longe, sonhar mais alto?! Querer mais e mais! Mais alto, mais profundo, mais longe, mais extremo, mais difícil, mais imponente, mais louco, mais assustador, mais intenso, quiçá impossível?!

Curiosidade… faz parte de nós e está intrinsecamente ligado ao ser humano! Foi esta que nos fez evoluir como espécie. E foi esta que me trouxe a mim, de encontro a este preciso momento, num sítio onde poucos ousam estar e a fazer o que poucos teriam coragem de fazer, enfrentando os meus medos e limites para fazer a minha história… a nossa história!

Por momentos transpirámos felicidade e irradiámos euforia. Até que nos tivemos de voltar a focar no objetivo! Segundo largo, o mais difícil! Com passos duros e delicados em pequenas pinças e regletes. Apesar de não mo dizer, sabia que o Jorge se sentia nervoso e um pouco desconfortável.

Ao longe, podia vê-lo executar os passos mais técnicos e exigentes, só podendo ficar a imaginar os seus mais íntimos pensamentos. Quando despareceu do meu alcance, apenas o simples deslizar da corda por entre os meus dedos me dava sinal da sua presença.

É impressionante esse grau de compromisso entre duas pessoas, que confiam a sua vida uma na outra, através de uma simples corda.

Assustava-me não podermos comunicar e a ideia de algo errado poder acontecer. Era algo com o qual tínhamos de lidar e aceitar ao mesmo tempo. Faz parte do desafio! E, no entanto, orgulhava-me do Jorge, que com destreza e concentração, foi capaz de liderar numa escalada que já se encontrava tão perto do seu limite. Foi capaz de manter a calma numa secção dura fisicamente e onde o espaçamento entre proteções acarretava uma queda mais arriscada.

Voltei a sentir-me nervosa nos segundos que antecederam a minha subida. Sabia que ia ser duro e não me enganava! O grau de dificuldade acima do meus limites, a falta de comunicação com o Jorge, o grau de exposição, a falta de aquecimento inicial num grau mais confortável, as características da rocha polida e quente e até o fato de já termos começado tarde, fizeram sem dúvida daquela escalada a mais dura e desafiante que já tive até ao dia de hoje.

Deixei-me levar, por momentos, pelo medo, insegurança e frustração… faz parte do jogo às vezes. Aceitei o que sentia, tentei focar-me novamente e agarrei o compromisso. Executei os restantes passos mais duros e voltei a chegar ao encontro do Jorge, que me esperava de sorriso aberto.

Mais calma e confiante, dei-lhe também umas palavras de coragem para o que ainda aí vinha. Fiquei a vê-lo, triunfante, a escalar tão delicadamente cada porção de rocha. Depressa chegou a minha vez de seguir no seu encalço. Com o mais difícil para trás, deixei o corpo relaxar e a escalada voltou a fluir. Finalmente conseguia aproveitar verdadeiramente o que tinha à minha frente.

"... É impressionante esse grau de compromisso entre duas pessoas, que confiam a sua vida uma na outra, através de uma simples corda."

" ... Não havia nenhuma plataforma ou protuberância entre a rocha, sob os meus pés, e o trilho na base da agulha! Apenas vazio..."

Se existe algo de épico e imemorável sobre esta via de escalada na agulha, é sem dúvida a sua incrível exposição. `É algo que jamais esquecerei. Uma imagem que irá permanecer viva para sempre na minha memória. Uma sensação à qual tentarei sempre voltar nos meus sonhos.

Só tinha mesmo a placa de rocha à minha frente. Nada mais senão a rocha e a perspetiva do mundo lá em baixo. O vazio de ambos os lados e debaixo dos meus pés! Nada mais a que me agarrar senão à natureza e a mim mesma.

O sol já se tinha escondido por detrás da agulha, no entanto o azul do mar mantinha-se tão cativante como outrora. Já só faltavam dois largos, os mais fáceis. Estávamos cada vez mais alto. A vista cada vez mais impressionante! A água transparente da enseada permitia vislumbrar o leito marinho, criando lindos desenhos e uma palete rica em tons azuis. As pessoas transformaram-se em pontos coloridos no manto branco da praia e os barcos, espalhados sobre o mar, pareciam modelos de criança. Reparei que já só se encontrava uma mão cheia de pessoas na enseada, o que me deixou com um sentimento de preocupação. Sem ninguém a saber de nós, estávamos mesmo por nossa conta. Mais uma vez ali estava ele.. o compromisso!

Finalmente, quando chegou a minha vez de escalar a aresta de 30 metros, de graduação 6a, senti-me em sintonia com a rocha e pude gozar tranquilamente da escalada! Já não estava assustada, apenas maravilhada, olhando em redor depois de um e outro passo.

Gentilmente, ia movendo os pés, que com a rocha já mais fria, pareciam se aguentar nas mais pequenas presas. Lembro da beleza estonteante que se encontrava mesmo por debaixo dos meus pés e do gozo que dava olhar para baixo de cada vez que os reposicionava sobre pequenas arestas na rocha. Não havia nenhuma plataforma ou protuberância entre a rocha, sob os meus pés, e o trilho na base da agulha! Apenas vazio…

Seguiu-se uma esplêndida laje até ao topo. Sem descontinuidades, rocha solta ou passos duros. Podíamos descontrair e divertir-nos através da rocha até ao final! Desfrutar ao máximo daquele último momento a escalar a agulha, que naquele momento era unicamente nossa para conquistar!

A proximidade ao cume deixava-me delirante! Como será?! Que irei sentir?! Que se passará agora na cabeça do Jorge, ali sozinho no topo, à espera que me junte a ele?!

Um pequeno patamar… uma pequena parede vertical e finalmente… o TOPO! O Jorge foi retirando corda até eu estar de pé, cautelosamente equilibrada no topo da agulha, mesmo ao lado dele!

– “WOOOOOOOW” gritei cheia de emoção!!! Uma sensação incrível de liberdade atravessava-me o corpo à medida que me deixava levar por aquele instante.

Deixei-me ficar ali de pé, por breves momentos, a olhar incrédula 360 graus em meu redor sem uma única palavra me sair da boca! Era demasiado incrível para acreditar. Demasiado efémero para tocar.

Imagino agora como seria ver-nos de fora… dois vultos no topo da agulha e sobre tudo o resto! Naquele momento em que tudo o resto era acessório… quem era, de onde vinha e para onde iria… não existia mais nada nem ninguém! Apenas duas pessoas… não pessoas… dois pontos no topo de um sonho partilhado, envolvidos pela paisagem magnífica de um conto de fantasia.

Encontrava-me agora no topo daquela curiosa rocha que vira meses antes na capa de um livro. Se algum dia imaginei?! Talvez lá no fundo soubesse… As pequenas lágrimas que antes se associaram a medo e frustração eram agora de alegria, euforia e orgulho. Venci os medos, ultrapassei os meus limites e consegui chegar onde ambicionei estar um dia! Sem dúvida, o sítio mais incrível onde alguma vez estive! Tanto pela espectacularidade da paisagem envolvente, tão bela quanto selvagem, como pela singularidade do cume que havíamos conquistado. 

É impossível pôr em palavras aquilo que senti naqueles breves momentos de pé, mas certamente foram dos mais intensos que alguma vez ousei sentir. 

Por momentos ficámos ali… Sentados, colados um ao outro. Triunfantes e apaixonados pela ideia de termos sonhado o mesmo sonho e de tê-lo concretizado juntos!

"Apenas duas pessoas... não pessoas... dois pontos no topo de um sonho partilhado, envolvidos pela paisagem magnífica de um conto de fantasia."

"É sem dúvida aqui que me sinto bem, onde sou mais feliz, onde me sinto viva! Numa linha ténue entre o sonho e a realidade..."

Depois de estarmos algum tempo numa espécie de transe deixámo-nos levar finalmente pela euforia! Acreditámos que tudo aquilo era real e que estávamos mesmo ali, naquele cume incrível.

A paisagem de 360 graus era capaz de tirar o fôlego até ao maior pioneiro deste mundo! Esse mundo que parecia agora mais distante e estranho. Num lugar diferente daquele que vivemos no dia-a-dia, bem colados ao solo, no conforto e segurança da civilização. Não se viam casas, estradas ou qualquer construção humana… apenas uma embarcação aqui e acolá para nos lembrar da presença humana e que não estávamos completamente sós. Pensei nos meus pais! No que pensariam se nos vissem ali… se sequer acreditariam que alguma vez ali estive, quando até a mim me soava tão surreal.

Prometi a mim mesma que iria voltar num dia não muito distante. É sem dúvida aqui que me sinto bem, onde sou mais feliz, onde me sinto viva! Numa linha ténue entre o sonho e a realidade… e eu não queria mais sair dali! Sentia-me tão leve que parecia voar sobre as montanhas… estava em paz e livre de qualquer sentimento que me pudesse oprimir! Felicidade numa forma pura e simples!

Olhei… olhei… e voltei a olhar, tentando captar cada detalhe da paisagem para a poder carregar comigo para sempre.

A nordeste, um mar azul profundo a perder de vista até ao horizonte… a noroeste, o seu encontro com as abruptas falésias brancas de calcário que se elevam desde o nível da água até ao céu. Falésias atrás de falésias, que de tempos a tempos deixam escapar enormes blocos de rocha que permanecem hoje graciosos junto à enseada, lá em baixo. Com a ajuda dos elementos, esses mesmos blocos vão sendo erodidos para deixarem ficar apenas uma cobertura branca de pequenos seixos, memória da história de outros tempos, deixados apenas para serem continuamente arrastados para trás e para a frente pelas ondas que chegam à costa, até um dia se deitarem no leito marinho e quem sabe, um dia mais tarde, voltarem a fazer parte de mais uma majestosa montanha.

A sudoeste, o vale verdejante por onde horas antes tínhamos descido. Escavado pela água e pelo vento, permanecem visíveis as paredes de rocha de ambos os lados, com belas formas, esculpidas ao longo de milhões de anos. A sudeste, podíamos ver agora, pela primeira vez, os impressionantes e gigantescos penhascos verticais que se fundiam com o mar. Tão claros, tocados ainda pela luz do sol. Logo abaixo, os lindíssimos satélites, diversos pináculos de rocha, redondos e agarrados uns aos outros, fazendo lembrar a bossa de um camelo, com as suas paredes a ondular com pontos aqui e ali de arbustos verdes. Uma beleza estonteante, acrescida ainda do lindo tom azul do mar, com a sua textura rugosa produzida pelo passar do vento.

" ... memória da história de outros tempos, deixados apenas para serem continuamente arrastados para trás e para a frente pelas ondas que chegam à costa..."

"O tom suave de cores e o céu repartido em tantas tonalidades de rosa e azul, transformaram a paisagem à nossa volta..."

O dia já se fazia tarde e ainda tínhamos que descer a agulha! A praia tranquila lá em baixo parecia nos chamar agora. Em pouco tempo, repelámos encosta abaixo até à base da agulha.
Quando toquei o chão, surgiu um sentimento incrível de alívio e satisfação! Festejámos com abraços e brincadeiras. Arrumámos o material e seguimos o resto do trilho até à tão aguardada enseada.

Wooowwww, o Jorge que conte o quanto eu transbordava de alegria!

Era final de tarde e já não havia um único feixe de luz sobre a praia ou sobre o mar, já que o sol se tinha deitado por detrás das paredes a oeste. O tom suave de cores e o céu repartido em tantas tonalidades de rosa e azul, transformaram a paisagem à nossa volta, conferindo-lhe um ar tão romântico e mágico, que nos hipnotizava os sentidos.

O mar, ainda assim num azul estonteante, aclarava à medida que se aproximava da linha de costa e uma lindíssima curva era criada pelo contacto do mar com a costa… tão ténue que mal dava para distinguir onde começava a água. 

Por último, descemos as escadinhas com proteções em madeira, rumo ao paraíso!

As montanhas que acompanham todo o golfo eram agora apenas silhuetas escuras vistas ao longe, identificadas apenas pelas suas formas e feitios. A praia tão branquinha, permanecia guardada por penhascos… e o mar tão azul, criava um som tão agradável ao arrastar os pequenos seixos redondos e branquinhos ora para a praia ora para o mar.

Não hesitei e quando dei por mim já estava dentro de água, delirante com cada sensação, cheiro e vislumbre. Mergulhava para ouvir aquele som fascinante das pedrinhas e voltava a emergir radiante, olhando para a agulha, incrédula de ter estado momentos antes no seu topo. Era surreal, tudo parecia fazer parte de um sonho e no entanto tudo aconteceu! Momentos depois de estar naquela pontinha lá no alto, mergulhava no mar, deliciada pelo momento íntimo com a natureza.

O Jorge juntou-se a mim… brincámos e rimos… foi tão bom e divertido! Vivíamos intensamente! Sentimo-nos autênticos e sortudos por nos termos um ao outro e por partilharmos aquele lugar, aquela aventura e instante juntos.

O sol já se tinha posto e era agora o reinado do crepúsculo! Vestimo-nos e miramos por uma última vez a linda enseada. Foi engraçado fazer o trilho na escuridão, com os frontais e as estrelas apenas por companhia! Apesar de cansada, adorei cada bocado do trilho, não só pela beleza e mística da noite e a espectacularidade do local, mas também pelo sentimento de satisfação depois daquele dia incrível! No entanto, o que mais me fascinava era a companhia do Jorge, que me deixava tão feliz pelo caminho afora, ao reviver comigo cada bocadinho da nossa aventura.

"...Mergulhava para ouvir aquele som fascinante das pedrinhas e voltava a emergir radiante, olhando para a agulha, incrédula de ter estado momentos antes no seu topo."

climbing aguglia

Cala Goloritzé, Sardegna

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1 Comment

  1. Emma Benink

    Wow!! Beautiful pictures guys!! I can’t believe we were on the same island! I just arrived home again! Such a beautiful country and lovely to see you guys so happy, and doing what you love!

    Beijinhos, aEmma (holandesa!???

    Reply

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